Greenpeace, entidade “beneficente”?

Rio, 13/fev/07 - Na Alemanha, como ocorre em toda parte e com todas as ONGs, o Greenpeace é considerado uma entidade beneficente sem fins lucrativos. Agora, porém, às voltas com uma virtual explosão de organizações do chamado “terceiro setor” no país, o governo alemão está questionando tal classificação e ameaça retirar parte das isenções fiscais que as favorecem, e a multinacional “verde” está na alça de mira.
Em agosto de 2006, o comitê científico assessor do Ministério das Finanças alemão divulgou um duro relatório sobre o “terceiro setor”, no qual chamava a atenção para a “proliferação caótica” de organizações beneficentes no país, muitas das quais representavam grupos de interesses especiais que aproveitavam as vantagens fiscais para influenciar a opinião pública em favor dos seus interesses. Por conseguinte, o comitê sugere uma redefinição do conceito de “sem fins lucrativos” de que gozam tais entidades, e que as isenções fiscais só sejam conferidas a organizações que proporcionem “vantagens coletivas reais”.
Ou seja, nas palavras do jornalista e escritor Thomas Deichmann, “organizações que não apenas afirmem em seus estatutos que o público em geral se beneficia das suas atividades, mas também proporcionem provas desses benefícios”. Segundo ele, os funcionários do ministério estão convencidos de que entidades beneficentes religiosas e similares merecem continuar desfrutando das isenções fiscais, mas o mesmo não se aplica a ONGs como o Greenpeace. [1]
Baseada em Hamburgo, a filial alemã do Greenpeace é a mais rica entre as 27 filiais
internacionais da multinacional “verde”. Em 2006, a sua arrecadação foi de aproximadamente 40 milhões de euros, proporcionada pelos seus 550 mil contribuintes no país, o que lhe permite arcar com uma grande parcela dos custos das operações mundiais da organização. Sem as vantagens fiscais, diz Deichmann, essa contribuição ficaria seriamente ameaçada, com sérias implicações para o Greenpeace International.
O problema é que o Ministério das Finanças está propondo que, para se qualificar como entidades beneficentes, as ONGs ambientalistas não sejam orientadas “primariamente para influenciar politicamente a opinião pública”, mas que os resultados específicos de suas atividades em favor do meio ambiente sejam estritamente avaliadas e comprovadas. E é aí que a porca torce o rabo, pois apenas algumas atividades do Greenpeace se enquadrariam em tais exigências, o que não ocorre, por exemplo, com as suas campanhas contra o banimento dos organismos geneticamente modificados (transgênicos) e a energia nuclear na Alemanha.
Deichmann resume a questão com maestria: “É claro que o Greenpeace tem o direito de argumentar o quanto quiser contra os cultivos transgênicos e outros avanços científicos. Mas quando ele recebe efetivamente apoio estatal para fazer tais protestos, isto coloca um peso extra aos seus argumentos, mesmo quando eles sejam, freqüentemente, anticientíficos e antitecnológicos. O Greenpeace é um grupo de influência que, ao meu ver, se coloca como uma barreira ao progresso científico. Se ele pode arrecadar independentemente o dinheiro suficiente para continuar apresentando os seus argumentos, boa sorte! Aqueles entre nós que discordamos podemos apresentar os nossos argumentos em resposta. Mas é outra coisa completamente diferente, quando um grupo desses é privilegiado em relação a outros e recebe um palanque isento de impostos para fazer as suas campanhas políticas.”E conclui: “Alguns de nós temos uma visão completamente diferente da do Greenpeace sobre o que é de interesse e do bem público. O debate sobre essas coisas deveria ser colocado em um campo de disputa equilibrado, em lugar dessa situação em que um dos lados do argumento é favorecido e elevado acima do outro.”
Os brasileiros que têm visto um projeto de desenvolvimento ou qualquer avanço tecnológico ser obstaculizado pela ação do Greenpeace e caterva devem ficar atentos aos desdobramentos da iniciativa alemã. Agora, diante da perspectiva de instalação de uma nova CPI das ONGs no Senado, uma nova oportunidade se abriria para uma mais que necessária rediscussão sobre o tema em nosso país.
Notas:[1]Just how ‘charitable’ is Greenpeace?, Frankfurter Allgemeine Zeitung, 24/01/07